sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Doce Bailarina no Jardim



As flores alaranjadas daquele imenso jardim sorriam para ela, em um dia limpo de verão, com nuvens pincelando o céu, espalhadas por uma brisa fina e constante. Seu coração seu encheu de gozo e bailava em meio às flores dançantes daquele dia. Os raios solares atingiam seu rosto pálido que se transformava em luz, rodopiando e cantando alegre. As sapatilhas se enchiam com a terra vermelha que explodia junto com suas passadas tortas e quase desajeitadas.

Bailaria o dia todo, a noite toda, todos os dias, eternamente. Feita de forma única, a bailarina rodopiava entre os arbustos e flores, galhos roçando, atrevidos, seu corpo frágil, ágil, contudo. Menina pequena, corpo de mulher. O olhar trazia todo o mundo e seus sentimentos mais densos e quase esquecidos. Os homens não viam lógica em sua dança, nunca poderiam; tiveram seu coração congelado, incrustado num peito gélido. O amor se transformou em fumaça branca e efêmera, subindo e sumindo num céu pesado, aguardando o início de uma chuva ácida.

A bailarina girava com passos curtos, os pés cansados e sofridos. Seu cabelo úmido balançava aliviando o calor do sol que a banhava. Uma mulher roliça desatou a chorar e levou uma bronca pública de uma velha. Alguns homens tentaram intervir, queriam fazer a moça parar, à força se necessário.

As pessoas que a vislumbravam, uns maravilhados, outros insultados, começaram a resmungar e, logo, o resmungo virou burburinho, e já havia uma grande confusão. Os girassóis viraram de costas para as pessoas e apoiaram a garota. Seus olhos brilhavam e o sol, a convidava a continuar sua dança ousada.

A terra foi ficando firme e resistente. As crianças começaram a aplaudir, os homens as recriminaram, algumas mulheres brigaram com eles. Os aplausos foram ficando mais fortes, as crianças assobiavam, as mulheres aclamavam e choravam, os homens estavam indignados, não sabiam como fazê-la parar.

A bailarina sorriu, antes do último suspiro. Havia crianças dançando com ela e algumas mulheres começavam os seus primeiros passos quando um som surdo e seco ressoou no ar. Ninguém conseguiu identificar o que era ou de onde vinha, mas viram a bailarina cair com seus olhos vidrados e seu corpo frágil ensanguentado.

Gritos, desespero, logo a pequena bailarina já não estava mais ali. No entanto, não conseguiram conter a semente que ela plantara, outras bailarinas apareceram. Abatidas como pássaro triste, no início, mas persistentes e tantas, que foi impossível aos homens abaterem-nas. As crostas dos corações gélidos estavam derretendo.
 

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